Qual a sua história com o bairro?
Nasci e cresci na subida da Rua Ferreira de Andrade, num entrelugar entre Cachambi e Maria da Graça. Perto do Jacarezinho. Da janela, além dos tiros, ouvia os ensaios do mestre Paulo Moura, cujo estúdio era na mesma praça. As famílias dos meus pais são ambas da região então frequento esse trecho do Grande Méier e o Lins desde que me entendo por gente. Aos 17 meus pais se mudaram e dez anos depois, em 2013, voltei a morar aqui.
Como surgiu a ideia de criar esse evento na praça do Méier e porque de graça?
A Praça Agripino Grieco já abriga eventos há muito tempo mas não lembro de ter visto algo que tenha me interessado mais do que a capoeira. Sempre transitei em grupos diferentes na escola, desde a galera metaleira, os evangélicos, os nerds, (menos os pseudo-playboys meliantes) mas nunca frequentei o bairro culturalmente, ou seja, nunca fui às rodas de RPG, as rodas de rima, os encontros dos roqueiros e tal, apenas ‘peladas’ avulsas. Mas quem cresceu entre 80 e 90 na zona norte do Rio viu uma cidade com medo e uma economia frágil. As tias nas cadeiras de praia na calçada, as rodas de samba e as espontaneidade de rua do subúrbio ficaram restritas a grades, muretas mais altas, os cinemas viraram igrejas neopentecostais e “Globo e você, tudo a ver.”
Quando passei a escutar mais o samba e assimilei que o finado Clube do Samba ficava há 1km do prédio onde morava e todo dia me deparava com um Imperator – mercadinho, comecei a questionar essa divisão na cidade.
Em 2012, 87% dos aparelhos de cultura se encontravam na zona sul do Rio. Se já há um olhar maior da cidade para a zona norte (além de novelas e seriados caricatos), que aproveitemos o impulso e valorizemos nossas esquinas, nossas praças, nossas poesias urbanas. É preciso revalorizar o espaço público, ocupá-lo, cuidar bem dele e deixar claro que é nosso.
Além da óbvia democratização do espaço, é nosso dever produzir e oferecer cultura GRATUITA na cidade mais cara para se viver no Brasil.
Você acredita que o Méier tem potencial para outros tipos de eventos culturais?
O Méier, além de público, tem espaços que devem ser utilizados e ocupados o quanto antes. Potencial há e muito, precisamos construir e acessar o público que se interessa por esse tipo de evento e tentar despertar a curiosidade de quem não.
O que falta para o Méier se tornar um bairro referência em cultura?
Faltam aparelhos, investimentos, visibilidade e vontade política.
Você acha que o poder público está trabalhando para melhorar a situação do bairro?
Enquanto o Salgado Filho for um açougue, a regulamentação e serviço de ônibus e trem forem esse escárnio e as UPPs e Choque de Ordem forem as únicas representações do “poder público” no bairro, a situação vai melhorar apenas e talvez, para a classe média.
Quais são seus planos para o futuro?
O plano é ampliar a área de atuação do Perto do Leão Etíope do Méier e estar presente em outras atividades culturais na zona norte. Sou colaborador do Norte Comum, uma grande frente de atuação com esse mesmo prisma. 2014 já está sendo um ano de muito brilho e fervor na cultura e política do Rio de Janeiro e o NC representa a proatividade e o repensar das relações humanas e da cidade por um olhar menos óbvio e mais inclusivo longe da praia e dos arcos da Lapa.
Pedro Rajão é DJ, produtor e diretor do documentário aNikulapo, sobre a trajetória da música e movimento político de Fela Kuti.